Design at Wine: dos rótulos aos 5 sentidos
No fim de 2023 Suzana Parreira (Faculdade de Belas Artes) e João Pedro Rato (Mutante.PT), designers, decidiram criar um projeto em conjunto: um concurso sobre os rótulos dos vinhos - DESIGN AT WINE.
E qual a razão disso? Bom, todos sabemos que há rótulos que parecem verdadeiras obras de arte, outros que não possuem grande expressão, e aqueles que nos levam a comprar um vinho (sim, eu já comprei vinho por gostar do rótulo kkk).
Abertas candidaturas, enviadas garrafas e caixas, em dezembro de 2023 tivemos vencedores das várias categorias - e vocês podem saber de todos aqui.
Bom, passado pouco mais de um ano, a Dupla por detrás do Design at Wine inovou mais uma vez: decidiu criar uma experiência multisensorial tendo como base os vinhos dos rótulos vencedores - afinal, se os rótulos nos agradavam tanto, será que os vinhos correspondiam?
Assim, a experiência foi dividida em momentos que correspondiam aos 5 sentidos: visão, tato, olfato, paladar e audição.
VISÃO
Para a visão recebemos dois desafios:
O primeiro correspondia a experimentar um vinho, saborear um prato e verficar um rótulo. Para cada um destes deveríamos escrever uma palavra que caracterizasse cada um.
O segundo desafio foi observar uma imagem - de um rótulo - e escreve a história da ilustração.
A visão é dos sentidos que normalmente mais utilizamos - especialmente quando falamos dos rótulos, não é mesmo?
Por isso, o primeiro desafio - visual - não trouxe grandes complicações.
O primeiro vinho foi o Pet Nat Alvarinho da Soalheiro. Foram apresentadas 4 garrafas com rótulos diferentes uns dos outros (mas o mesmo vinho). O rótulo remete ao olhar do agricultor para o céu, e para o Pet Nat, pois neste o gás se mexe de forma elegante, naturalmente, como as nuvens.
Na gastronomia tivemos tarteletes de lagosta, gengibre e manga verde. Para deixar ainda mais colorido, utilizaram pétalas de flores comestíveis.
Aqui, como devíamos deixar uma palavra para cada, sem ter necessariamente uma conexão com o vinho, escrevi: drink - paz - jardim (na ordem das fotos). Foram as primeiras palavras que me vieram à mente ao ver cada um.
No segundo desafio visual tivemos que descrever a história sobre o rótulo abaixo:
A maioria escreveu sobre superação de pedras no caminho. A minha história foi mais infantil ahhahaha sobre um homem que carregava pedras e descobriu através do vinho como diminuir o cansaço e peso da pedra.
A verdadeira história, contada pelo Rodrigo e pela Ana, da Espera Wines, é a seguinte: as uvas para a produção deste pet nat são plantadas em Alcobaça, em solo de argila-calcário; quando foram plantar as vinhas descobriram que existiam muitas pedras - de calcário. A ideia então foi a representação da pedra de calcário sendo levantada por uma personagem do Mosteiro de Alcobaça. O mais engraçado foi dizerem que era o rótulo que os Designers menos gostaram - e é simplesmente inovador!
TATO
Novamente recebemos dois desafios: 1. Descrever com uma palavra o vinho, o rótulo e o prato; 2. Escrever uma cor depois de sentir o objeto que estava na caixa (não conseguíamos ver o objeto).
No primeiro desafio estivemos a degustar o vinho branco Milmat da Mainova, cujo rótulo delicadamente possui um relevo - a atenção precisava ser grande para conseguirmos detectar este pormenor.
Na gastronomia foi-nos servido um mil folhas de cogumelos, brie e avelãs - as texturas e uma sensação que variava de doce e salgado - praticamente ao mesmo tempo - foi surpreendente. A ideia era avaliar desde como pegar o mil folhas, mas também a sensação de boca.
Na segunda experiência do tato colocamos a mão em uma caixa escura onde sentímos uma garrafa de vinho. A garrafa é emblemática e quase todos - com exceção de uma participante - escrevemos “rosa/rosé”. No entanto, a cor correta era azul!
A garrafa em questão era do vinho Mateus rosé, mas uma garrafa de edição especial, cujo rótulo cobria por inteiro a garrafa e a cor predominante era azul. Fomos levados, automaticamente, a pensar no Mateus rosé e, consequentemente, na cor rosa/rosé. Isso demonstrou o quão forte é a marca desta garrafa/vinho.
A única Participante que não disse rosa/rosé foi a que não conhecia a garrafa e escreve - exatamente - azul - por estar o objeto frio e pensar no azul para representar esta sensação. Às vezes, saber demais (!!) leva ao erro ahahahah
OLFATO
Servido o vinho, deveríamos escrever com uma palavra - e tendo como orientação o olfato - cada aroma do vinho, do rótulo e do prato.
Para a parte gastronomica degustamos um tartar de salmão com wasabi e lima kafir, sobre este poderíamos borrifar um spray de lima ou gengibre - optei pelo gengibre. Em termos de olfato era muito agradável, e a mistura de aromas me levou a pensar em um jardim (palavra que também escolhi para a primeira experiência, a visual).
O vinho foi o Malhadinha Nova rosé - um vinho com uma garrafa lindíssima - bem como seu rótulo. O fundo da garrafa e o rótulo se complementam em grande harmonia. No entanto, o visual não era objeto de análise neste momento, e pensar no olfato e relacionar com o rótulo foi um desafio que não superei.
Quanto ao vinho propriamente, a palavra escolhida foi frescura - vinho elegante, fresco e que, embora servido acompanhado, não senti a necessecidade de o ser. Muito longe de um “rosé de piscina”, mas também sem “pedir comida”. Bem equilibrado.
Em um segundo momento recebemos um pequeno pote com um “creme”. Cheiramos e escrevemos uma memória a seguir. A minha memória aqui remeteu a um cheiro herbal, indo para a grama/relva cortada (um dos cheiros que adoro). Na verdade, o produto era apenas um creme de rosto, e que supostamente não possui aromas.
PALADAR
Recebemos um vinho e um prato. Para o vinho saboreado, garrafa nas mãos, e prato apreciado, novamente escrevemos uma palavra para o sabor de cada um.
No quesito gastronomia este foi o auge da experiência, na minha opinião. Um croquete de cabrito estufado/assado com hortelã e framboesa. Disse ao Chef Rafael e deixo registrado: sabor inesquecível - e que pretendo ter a oportunidade de repetir. A palavra para o prato foi ESPETACULAR - não vejo outra que se encaixe de forma melhor.
Para o vinho, o escolhido foi um vinho tinto: o Tapada de Coelheiros 2020. O rótulo é a junção da história, localização e inovação. A Tapada de Coelheiros fica em Arraiolos, onde tradicionalmente são feitos os tapetes de Arraiolos. Por isso, o rótulo representa um tapete (os pontos marcados), demonstrando a localização da herdade.
Ao descrever com uma palavra o “paladar do rótulo” escolhi história, mas sem pensar propriamente no paladar - algum/a leitor/a consegue sugerir uma palavra? (Deixe um comentário :) )
Vale mencionar que, quanto ao rótulo, a mudança acontece ao mesmo tempo no qual a Tapada de Coelheiros recebe seu novo enólogo, o Luís Patrão, sendo um ponto de inovação no trabalho desempenhado.
Para o paladar do vinho a palavra escolhida foi intenso. O vinho alentejano foi perfeito com o croquete, dando a intensidade que o prato merece, numa harmonia singular.
AUDIÇÃO
Neste último momento ouvimos um conjunto de sons, e para cada um deveríamos escrever doce ou salgado.
Foi uma experiência bem difente! Duas sobremesas, um vinho - o Porto Churchill Tawny 30 anos.
Para a primeira sobremesa tivemos um cheescake queijo cabra meia cura chalotas e arantos; na segunda, uma mousse de chocolate negro em sifão com azeite e cacau. A cheescake era super estaladiça! Foi uma sensação engraçada.
Ao ouvir o conjunto de sons descrevi “salgado” para a cheescake e “doce” para a mousse. Vale mencionar que nenhuma das duas sobremesas tinha como característica predominante um destes sabores.
Esta experiência - da audição e descrição de doce/salgado - foi baseada nos estudos de Charles Spence, fundador do Oxford University’s Crossmodal Research Laboratory e professor de psicologia experimental da mesma Universidade.
Em conclusão, posso dizer que a experiência foi completamente diferente e interessante, sendo um projeto inovador em Portugal. Para mim, os rótulos dos vinhos trazem muita personalidade a estes, levando-nos a pensar que um vinho pode ser muito bom (ou não) tão somente pela sua “aparência”.
Alguns projetos vínicos levam a sua história nos rótulos - como pudemos verificar em alguns mencionados por aqui; outros permitem que possamos reconhecer em qualquer lugar a sua marca (é o caso da icônica garrafa do Mateus rosé).
Confesso que tive algumas dificuldades (especialmente no tato e olfato). Trouxe também novas percepções e ideias para projetos.
O Design at Wine traz este olhar para além da bebida, e consegue nos surpreender ainda mais com a possibilidade com a percepção eno-rótulo-gastronómica.
O próximo concurso do DESIGN AT WINE será lançado ainda em janeiro de 2025 e você pode acompanhar (e concorrer) através do site da Mutante.PT.